ANALISANDO O FATOR HUMANO EM UMA AUDITORIA DE ACIDENTE AÉREO
ANALISANDO O FATOR HUMANO EM UMA AUDITORIA DE ACIDENTE AÉREO
O PRIMEIRO RELATÓRIO
As
conclusões do primeiro relatório de especialistas indicam uma conjunção
de fatores: falhas humanas, problemas técnicos, procedimentos
equivocados e condições meteorológicas adversas. Com base nessas
conclusões, Air France e Airbus foram processadas em 2011 por homicídios
culposos. Observem que o conjunto de fatores mencionado é bastante
comum em qualquer ambiente de trabalho tambem em terra e vale para a
análise de qualquer grande acidente de trabalho, como por exemplo, em
plataformas de petróleo ou na mineração. Ou seja, é preciso uma análise
sistêmica envolvendo todos os fatores.
O NOVO RELATÓRIO
Agora,
surge um novo Relatório concluindo que o acidente se deveu à perda de
controle do avião causada pela reação inapropriada da tripulação após a
ausência momentânea das indicações de velocidade e assim enfatizando o
fator humano, o clássico “comportamento inseguro”. O Relatório
apresentou uma lista de 14 fatores que contribuíram para a tragédia, por
ordem de importância. Neste caso, ao invés de análise sistêmica, foi
dada predominância ao fator humano como responsável pelo acidente.
Abaixo, um quadro com as principais conclusões desse 2º. Relatório solicitado pelo Judiciário da França:1. Reação inapropriada da tripulação depois da perda momentânea das indicações de velocidade de um Airbus |
Contexto:
o
avião dispõe de um equipamento para detectar a velocidade; este
equipamento (pitot) sofreu um congelamento provocando uma desorientação
da tripulação, que segundo o Relatório não adotou comportamentos
compatíveis com a gravidade do problema. |
2. As simulações apontaram que houve uma predominância de fatores humanos nas causas do acidente e nos fatores que contribuíram; observou-se a ausência de uma análise estruturada da pane, má compreensão da situação e a divisão de tarefas na cabine que não foi aplicada de maneira rigorosa. |
Contexto:
ausência
de instruções claras por parte de Air France, apesar de vários casos
parecidos de congelamento das sondas Pitot e, portanto, de uma resposta
insuficiente. Além disso, concluiu-se por uma formação inadequada dos
pilotos na aplicação do procedimento necessário para lidar com o
congelamento das sondas e com o comportamento do avião durante a perda
das indicações de velocidade. |
Abaixo,
algumas observações complementares sobre o assunto e que envolve o
comportamento de trabalhadores, seja em uma grande aeronave, seja com
Máquinas e Equipamentos modernos que passam a fazer parte de
determinados ambientes de trabalho
OS FATORES ERGONÔMICOS
Um
grande problema invisível não só da aviação mas de equipamentos de alta
complexidade atualmente é o pseudo-conforto promovido pelos modernos
equipamentos eletrônicos que dispensam quase que 100% da habilidade do
piloto e dos operadores. Vale lembrar uma frase dita por um piloto em
uma palestra: "Nós não somos mais pilotos, somos gerenciadores de
sistemas. Tudo está informatizado e pegar no manche virou mais um
sonho". Não menosprezando a grande benção que a tecnologia nos
proporciona a cada dia, mas muitos pilotos e operadores se acomodam
naquela rotina de não mais pegar no manche do avião e só girar botões
para configurar o piloto automático, e acabam perdendo a "mão" e a
sensibilidade de voar. Assim, seja para pilotos ou para operadores de
máquinas complexas, a confiança excessiva na tecnologia e a perda de
avaliação do contexto em que se dá a operação pode ser o fator decisivo
na segurança ou no acidente. Esse foi o fator decisivo para aquele
fatídico acidente do Air France em junho de 2009.
Aquele
voo passava pela ITCZ (Zona de Convergência Intertropical), em outras
palavras, uma região ao redor da linha do equador de muita turbulência,
nuvens, trovoadas, cristais de gelo e todo tipo de formação
meteorológica desagradável para qualquer tipo de navegação, 24 horas por
dia. Não culpando a ITCZ, afinal, todo dia centenas de aviões passam
por ela ao longo do globo e dispõem de equipamentos que preveem com
antecedência as temidas formações e informam os pilotos para tomar as
devidas medidas preventivas. Assim, é muito raro os sistemas do avião
congelarem, mas não impossível.
Qualquer
avião deve ter pelo menos em seu painel o altímetro (informa a
altitude), velocímetro (informa a velocidade) e o variômetro (indica a
razão de subida) basicamente. Os três dependem exclusivamente do Tubo de
Pitot, um dispositivo que fica no lado externo da aeronave e que recebe
o impacto do vento (pressão dinâmica, que informa a velocidade) e a
variação de pressão estática (que informa a altitude e razão de subida).
Conhecido também como Sonda de Pitot, esse dispositivo é passivo de
sofrer congelamento devido às baixas temperaturas das altas altitudes, e
quando isso acontece, as três informações fundamentais de altitude,
velocidade e razão de subida são afetadas drasticamente, ou seja, meio
caminho para uma fatalidade.
O
primeiro evento de perda temporária da indicação de velocidade ocorreu
com um avião da Air France. A companhia relatou o problema à Airbus e
pediu mais informações e soluções para esta causa. Também perguntou à
Thales, fabricante do sensor, se poderia resolver tais problemas. A
Airbus respondeu que a causa seria provavelmente a obstrução da sonda
por acúmulos de cristais de gelo e que o sensor da Thales não estava
projetado para evitar a ingestão de água durante fortes chuvas sendo
improvável melhorar o desempenho num ambiente onde houvesse cristais de
gelo. A conclusão da Airbus foi que não havia solução para eliminar
totalmente o risco de congelamento da sonda e que providenciaria um
procedimento a ser aplicado no caso de inconsistências nas leituras de
velocidade. A Air France decidiu substituir imediatamente todos os
sensores de toda sua frota de A330/340. A aeronave do acidente ainda
estava equipada com os sensores originais.
Associando
a falsa zona de conforto citada no início do texto com o congelamento
do Pitot, temos as respostas para o acidente da Air France. Pilotos
acomodados com o piloto automático por muito tempo em suas carreiras,
sem ter mais a noção de sensibilidade de velocidade ou altitude, não
souberam perceber que o avião estava com baixa velocidade e entrando em
estol, e confiaram cegamente no indicador de velocidade que
aparentemente mostrava um valor normal quando nada mais era que o erro
proveniente da sonda congelada. Não souberam tomar uma decisão
apropriada e o piloto automático teria manobrado excessivamente o leme
do avião afim de evitar as formações meteorológicas, causando sua
ruptura, o que tornava o avião impraticável. A ruptura do leme causou
também despressurização e quando os pilotos perceberam , era tarde
demais para fazer algo. A morte já era certa.
Grandes
acidentes de trabalho ocorrem em situações tão complexas, com fatores
sistêmicos de difícil avaliação, como de resto é o fator humano nessas
situações. No final, é a tomada de decisão que pode evitar ou precipitar
o pior.
Gabriel G Pessoa
estudante do curso de Ciências Aeronáuticas, PUC-Goiás.
estudante do curso de Ciências Aeronáuticas, PUC-Goiás.
Abaixo uma tabela desenvolvida por especialistas na análise de acidentes envolvendo as principais variáveis
TABELA PARA ANÁLISE DE ACIDENTES
Segundo
especialistas a análise de acidentes deve incluir o Estudo de 11 das
condições listadas, com indicação se Humana (H), Tecnológica (T) ou
Organizacional (O)
Disponibilidade de recursos humanos e técnicos
|
H, T
|
Treinamento e Experiência
|
H
|
Qualidade de comunicações
|
H, T
|
Interações homens-máquinas, incluindo concepções de interfaces e formas de suporte operacional
|
T
|
Acesso a procedimentos e métodos
|
H
|
Condições de Trabalho físicas e organizacionais
|
T, O
|
Número de metas e regras ou princípios (critérios) para resolução de conflitos
|
H, O
|
Tempo disponível (pressão de tempo)
|
H
|
Ritmo circadiano (privação de sono e assincronias que podem comprometer desempenhos
|
H
|
Qualidade de colaboração da equipe/tripulação
|
H
|
Qualidade e suporte da organização
|
O
|
A Equipe NRFACIL
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