ACIDENTE DE TRAJETO - CAT - E BO
Algumas empresas
passaram a exigir que para a caracterização do acidente de trajeto
seria necessário um Boletim de Ocorrência junto às autoridades, seja
Polícia ou Bombeiros. Esta providência visaria assegurar a veracidade
das informações prestadas pelo empregado quanto à efetiva caracterização
do acidente como de trajeto sendo que a forma mais adequada seria o
registro policial. Este procedimento baseia-se em um dos dispositivos da
NR-1. No site www.nrfacil.com.br abrimos a pasta da NR-1 (DISPOSIÇÕES
GERAIS) e ao clicar no Remissivo no item “obrigações do empregador em
SST”, veja o item “e”, atribuindo à empresa prerrogativas para
estabelecer procedimentos no caso de acidentes:
Portanto, essas
empresas exigem que o funcionário terá de fazer o registro da ocorrência
de atendimento e trazer o comprovante de forma imediata como
pré-requisito para emissão da CAT. Elas alegam que podem ser
surpreendidas posteriormente à emissão da CAT de que não houve
propriamente um acidente de trajeto, mas o empregado poderia ter
participado de um assalto ou até de homicídio. Ao mesmo tempo, alguns
acidentes de trajeto poderiam levantar a suspeita da própria Previdência
sobre a veracidade das informações, principalmente quando a situação
envolve a concessão de benefícios. Outros especialistas sugerem que o
SESMT deveria abrir uma investigação do evento e só fazer a
caracterização de acidente de trajeto após a apresentação do BO.
A questão que se
apresenta é: será que este procedimento é ético e legal? o item “e” da
NR-1 outorga de fato o poder de a empresa estabelecer este procedimento?
ao exigir testemunhas para a elaboração da CAT, o Relatório de um BO se
enquadraria nessa categoria?
Alguns estudos
consideram que de fato, todas as pessoas que se acidentam no trânsito,
exceto os de finais de semana, a vítima quase sempre está se deslocando
ou voltando do trabalho ou até mesmo trabalhando.
Alega-se que o
comportamento humano incorreto é a causa fundamental dos acidentes de
trajeto, provocada por problemas físicos, inclusive visuais, por
influências tóxicas (álcool, e outras drogas, inclusive medicamentos),
fadiga, falta de atenção, negligência e a imprudência – vários
trabalhadores, a fim de chegar mais cedo no trabalho ou de volta pra
casa, desrespeitam normas de segurança do trânsito e se expõem a
acidentes como por exemplo, embarcando em veículos em movimento. Além
disso fazem uso de bicicletas e motos que são as mais vulneráveis a
acidentes de trânsito e muitas vezes sem utilizar os equipamentos de
segurança nesses veículos leves. Trabalhadores operando veículos tambem
se acidentam por desrespeitarem regras de segurança (não utilizar o
cinto, desobedecer à sinalização e os limites de velocidade, e falarem
ao celular). Outros motivos relacionam-se à falta de manutenção dos
veículos, inclusive dos pneus. Finalmente, um dos principais
relaciona-se à falta de investimento das empresas em treinamentos como
direção defensiva e na manutenção dos veículos de transporte de cargas.
Mencionam-se, ainda excesso de jornada, trabalhadores desqualificados
para algumas tarefas e falta de treinamento, como as principais causas
de responsabilidade das empresas.
Apresentamos neste
Post o Parecer do Técnico de Segurança Jaime Silva, que trabalha em
empresas de transporte no Rio de Janeiro. E veja também no final, 3
exemplos de decisões judiciais que são representativas da situação.
CARACTERÍSTICAS
Estima-se que um terço dos acidentes de
trânsito estão relacionados a acidentes de trabalho, assim chamados
acidentes de trajeto.
Esses acidentes
tem o mesmo status de qualquer acidente de trabalho, atribuindo ao
empregado estabilidade de 12 meses após receber alta do INSS, salário em
afastamentos de até 15 dias e auxílio-doença acidentário em
afastamentos maiores que isso. É esse o motivo principal de conflito de
interesses entre a empresa e o trabalhador.
Em posts
anteriores analisamos os custos de acidentes de trabalho, seja a nível
administrativo (multas) seja no nível judicial (indenizações). A Justiça
do Trabalho geralmente considera que o acidente de trajeto só poderá
ser descaracterizado como acidente de trabalho quando há um desvio muito
relevante na trajetória, como a ida a locais diferentes do local da
empresa ou quando o trajeto escolhido demandará mais tempo ou menos do
que o esperado (atalhos). Entretanto, a empresa tenta na maioria dos
casos evitar a emissão de CAT de forma a não caracterizar acidente de
trajeto e assim sofrer os custos de horas-paradas e principalmente a
estabilidade após o retorno. Para muitas empresas, empregados estáveis
por acidente são praticamente trabalhadores-problema, começam a faltar
alegando sequelas, fazem corpo mole ou então adotam comportamentos de
desafio e desobediência de normas, inclusive de segurança. Dependendo do
grau de incapacidade após o acidente, este trabalhador vai se tornando
mais caro que os demais.
Este
debate foi objeto de discussão entre especialistas da Sociedade
Brasileira de Engenharia de Segurança (SOBES), que congrega tambem
Médicos e Técnicos de Segurança. Um dos participantes mencionou que
havia sido alertado por um Auditor Fiscal que considerou ilegal o
procedimento de exigir BO em caso de acidente de trajeto.
ACIDENTE DE TRAJETO E A EXIGÊNCIA DE BO
Toda
exigência administrativa não pode ser feita senão respaldada em Lei,
regulamentos ou normas. Exigir-se o BO para abertura de CAT nos casos de
acidente de trajeto é no mínimo contraditorio, com a atual politica de
segurança implantada nos estados. Pelo menos aqui no Rio de Janeiro, a
orientação é para que todo o efetivo policial trabalhe mais na contenção
do que na prevenção. Daí que, as ocorrências de menor poder ofensivo
somente são abertos em ponto fixos de policiamento, batalhões da PM. A
PMRJ não atende mais chamados para abertura de registros de ocorrência
de acidentes de trânsito ou Boletim de Ocorrência nos caso de acidentes
sem vítimas, imagine para realização de um BO por acidente de queda da
propria altura por exemplo.
Talvez a
empresa esteja exigindo B.O para que as circunstancias do
acidente fiquem caracterizadas de forma oficial e dispense testemunhas
do fato, que é ao meu ver o grande problema da empresas em aceitar como
verdadeira a narrativa dos seus empregados, que, como sabemos, muitas
das vezes transformam acidentes pessoais em acidentes de trajeto, sem
que haja testemunhas para o fato. Dependendo do tempo de afastamento
esse fato gera estabilidade ao acidentado.
Acredito, que por não termos um
instrumento legal que justifique essa exigência deveria ser abolida esta
pratica, até porque a CAT poderá ser aberta por outros agentes,
independentemente da empresa.
A forma de
você se acautelar quanto a um possível punição por parte de um AFT é
formalizar essa situação, apresentando alternativas para proteger a
empresa contra funcionários mal intencionados.
Somente serão abertas CAT de acidente de
trajeto, quando não for possivel a apresentação do B.O, mediantes as
seguintes exigências:
a) apresentação de testemunhas para o fato - essa informação é exigida ao preencher-se a CAT.
b) em se tratando de acidente de trajeto
em que houve necessidade de atendimento médico, deverá ser apresentado o
BAM (Boletim de Atendimento Médico), ou documento equivalente, além de
testemunhas para o fato.
Acredito, é aí abro o debate, que os
condicionamentos acima estariam respaldadas em instuções da Previdencia
Social, que institui o formulário proprio para comunicação de acidentes
do trabalho.
Jaime Silva, TST
JURISPRUDÊNCIA
Exemplo 1
Os familiares de
um soldador que morreu em um acidente de trânsito ao se deslocar para o
trabalho não devem ser indenizados. A 3ª Turma do Tribunal Superior do
Trabalho entendeu que a empregadora não era culpada.
O
trabalhador, de 63 anos, era soldador contratado por empresa prestadora
de serviço. O acidente aconteceu enquanto o trabalhador trafegava pela
BR-101 quando foi surpreendido por uma carreta. Houve colisão e o homem
morreu ali mesmo, no local do acidente.
O TRT
considerou a culpa exclusiva de terceiro — o motorista do caminhão que
invadiu a contramão de direção e colidiu com o veículo do empregado. Nem
mesmo a tese de omissão da empresa foi considerada como procedente, já
que no local do trabalho havia alojamento para os motoristas que
residissem em outros municípios.
A Justiça baseou-se no artigo 7º, inciso
XXVIII, da Constituição Federal - como não houve dolo ou culpa do
empregador, a indenização não caberia.
Exemplo 2
A Justiça
condenou uma empresa do ramo de transporte rodoviário de passageiros a
pagar indenização por danos materiais à família de um cobrador, morto em
acidente no trajeto de volta para a sua residência, em condução
fornecida pela empregadora. O laudo elaborado por peritos criminais
revelou que, no momento do acidente, o ônibus que transportava o
empregado, guiado por motorista da empresa, trafegava na contra-mão, o
que evidencia a culpa do motorista pela colisão com outros veículos que
transitavam na rodovia. Esse fato conduz à responsabilização da
reclamada pelo acidente, já que esta responde por atos praticados por
seus empregados em serviço.
Exemplo 3
Uma empresa
determinou que seu empregado, contratado como profissional da
informática, fizesse uma viagem a trabalho. Entretanto, o técnico de
teleprocessamento não conseguiu chegar ao destino. No meio do caminho,
ocorreu um grave acidente, que resultou na morte da vítima. A ação foi
proposta pelo filho menor do empregado falecido, tendo sido representado
no processo por sua mãe. Na ação, o reclamante pediu reparação pelos
danos morais sofridos por ele próprio, em decorrência do falecimento
prematuro do pai.
Pelo que foi
relatado no processo, o trabalhador se acidentou em razão do excessivo
volume de viagens e cobranças por resultados. O preposto informou que a
maior parte da jornada do empregado falecido era externa, pois ele fazia
manutenção no sistema informatizado da empresa. Dessa forma, quando
havia um problema técnico, o trabalhador era acionado por uma das
unidades da empresa localizadas em outros municípios e tinha de ir até
lá fazer o serviço. No entender do magistrado, é evidente a culpa da
empresa, que cometeu um erro ao contratar um técnico de informática e
exigir dele a realização de tarefa diferente e de alto risco, para a
qual não estava preparado. De acordo com as ponderações do julgador, a
empresa não poderia simplesmente entregar um veículo ao empregado e
determinar que ele cumprisse rotina de viagens. Isso porque o
trabalhador não foi contratado como motorista e, ao proceder dessa
forma, a ré assumiu o risco de que o empregado viesse a se acidentar,
como de fato ocorreu, e com um desfecho fatal.
NRFACIL
Consultoria: Jean Carlos, TST
Consultoria: Jean Carlos, TST
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